quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Desejos de um Feliz Ano

Num momento tão especial como este, resta-me desejar um Feliz 2009 e que todos os vossos desejos se concretizem. Prometo actualizar brevemente o meu blog, tenho montes de histórias novas para contar. Um cumprimento especial a todos os que acompanham a minha aventura. Sinto muitas saudades vossas.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Trans-amazónica

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Chegada ao destino e início de uma jornada diferente. O desembarque foi asustador. Não há cais para atracar, apenas uns mecos para amarrar o barco o mais próximo da costa. Duas tábuas, tres pessoas e muita fé, colocaram a moto em terra barrenta, mas firme.
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Para assegurar a empreitada, meti nos bolsos dos tripulantes alguns reais para que eles sentissem firmeza naquilo que estavam a fazer. Num susurro avisei que era uma tarefa séria, mas acabou por correr tudo bem. Não posso dizer o mesmo da minha viagem pela Trans-amazónica até Porto Velho. Não tive oportunidade de tirar muitas fotos devido ao mau tempo, sob pena de avariar o que resta dos equipamentos. A minha máquina para colocar no capacete deixou de funcionar, o ipod faleceu por afogamento, os documentos ficaram todos ensopados, a mota volta aos seus problemas de injecção, fiquei "quase" sem combustível, mas não estou nada preocupado.... o meu espiríto está em alta!
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Início do pesadelo
. Paragem de emergência... Gasolina a 4 Reais...
Fim do Pesadelo!!
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A abundante chuva e o vento forte quase proporcionavam o primeiro "tombo" a serio da viagem e se acontecesse não iria ser fácil… é como uma travessia no deserto mas passada a longo de povoações semi-indígenas. Acabei por dormir num descampado mais ou menos seguro e seco. Após 600 km e quase 20 horas de condução divididos em 3 dias e sem tomar banho (de água limpa, claro!) chego são e salvo ao meu destino - Porto Velho.
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Travessia em balsa do Rio Madeira
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A partir daqui a viagem tornou-se mais fácil até Cuiabá, capital de Mato Grosso. Fiz paragens para pernoitar em Ji-Paranã, Vilhena e Cáceres, num total de 1400 km ao longo da BR 364 e da 174. Os alojamentos são relativamente acessíveis e seguros e a comida é boa. Ao longo da estrada vão surgindo alguns restaurantes com refeições muito caseiras e com a tendimento familiar a preços económicos.
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Na chegada a Cuiabá, a moto entra em colapso com o seu tradicional problema de injecção. A temperatura é de 41º e quase derreto em cima da moto. Mais uma vez a moto fica num concessionário da Suzuki - a Moto Brasil.
Desta, o meu problema ficou resolvido de vez. Simon, o mecânico de serviço pôs fim ao problema... Afirmou que desta é garantido, vamos ver!!
Cumprimentos ao Fernando (proprietário), ao Simon, ao Carlos, a Hellen e um abraço a restante equipa da Moto Brasil pela amabilidade e simpatia.







quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Pelo Rio Madeira a bordo do Cristo Rei

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Sexta-feira 14.00 da tarde, dia quente e abafado. Tem chovido praticamente todos os dias e parece não haver previsão de melhorias no tempo… ao mesmo tempo ocorre a desgraça em Santa Catarina. Muita chuva nestes países é sinal de calamidade devido a forte quantidade num período tão curto de tempo. Não há previsão e prevenção possível, apenas uma questão de sorte… ou de fé!
Adiante… com a “cama” pendurada e com o meu espaço delineado com antecedência, na hora prevista e com tudo pronto, aguardo com ansiedade o zarpar do navio "Cristo Rei", para mais uma grande epopeia pela selva amazónica… lindo!!
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O barco teima em sair, tudo devido a grande quantidade de mercadoria a ser carregada tanto no porão como no convés. Aproximadamente 200 toneladas de tudo, desde ferro, cimento, farinha, cerveja, muita mercearia miúda e claro, a minha moto!
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O Rio Madeira é uma das 2 vias que ligam Manaus a Porto Velho, capital da Rondônia. Pelo rio circulam em embarcações de porte médio e em rebocadores, passageiros e diversos bens, num autêntico frenesim!
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A outra é a rodovia BR 319, chamada de Trans-amazónica… um verdadeiro pesadelo de lama, pó, buracos, pontes estreitas em madeira, com poucos locais para abastecimento, com défice de infra-estructuras, carencia de alojamentos... enfim!
Como julgava que o barco partia as 18.00, deixei de deslumbrar a confluência do Rio Solimões com o rio Negro, no chamado Encontro das Águas. A água relativamente barrenta, alcalina e castanha-clara ou “branca” do rio Solimões corre durante alguns kilometros até absorver as águas escuras do rio Negro… é só isso que acontece mas não tive oportunidade de ver, paciência…
Só por volta das 21.00 é que o Comandante decide arrancar e com o barco carregado até o pescoço lá vamos nós, sem nenhum tipo de electrónica de navegação, guiados pelas estrelas (quando o céu está limpo...coisa rara!) e Deus.
Conseguir dormir numa cama de rede não é tarefa fácil, muito menos com o barco em movimento e sempre com atenção aos nossos pertences porque é muito habitual ser roubado durante o sono… Que levem os anéis, mas deixem ficar os dedos, pensava eu com os meus botões.
Mas nada aconteceu, felizmente. O grupo era muito simpático e divertido.
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Sr. Eduardo, Junior e Fábio

As refeições eram servidas muito cedo. O pequeno almoço as 6.00, o almoço as 11.00 e a "janta" as 17.30. Eram confeccionadas ao estilo de “ração de guerra”, compostas por arroz, feijão, farofa, frango, carne de vaca estufada, suco de caju e café com um sabor envelhecido… a mofo!!
Para avisar que a refeição está pronta a servir, um dos tripulantes de um forma descontrolada, soava um apito, qual experiência de Pavlov… O banhos eram tomados com água “barrenta” do rio. A mesma água era utilizada na trivial lavagem bucal. O barco saiu da rota por duas vezes, encalhando na costa por longos períodos, fazendo com que aumentasse ainda mais o tempo da viagem.
Decido sair mais cedo do barco, que se dane… prefiro andar na estrada, já sinto saudades.
Avisei ao comandante que saia em Borba, mas acabei por desembarcar em Manicoré, um dia depois.
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Apesar de tudo, vale bem a pena a experiência, não só pela visualização do dia a dia das povoações nas margens do rio mas sobretudo pelo contacto com a natureza, que nalguns pontos é bem intenso e tranquilizador.
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O Rio Madeira com os seus reflexos únicos, proporciona ocasos de sol belíssimos!!
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Manaus, Capital mundial da Borracha 1888-1912

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Com a moto mais uma vez parada por alguns dias e depois de negociado o valor do hotel e das refeições, opto por ficar uns dias na capital da Amazónia.
Um pouco desordenada e suja com uma paisagem urbana algo decadente mercados ambulantes rodeiam o porto principal num agitado movimento, de um vai e vem de passageiros e mercadorias oriundas principalmente de Belém e Porto Velho, agitam um porto “moderno” com a descontracção de uma localidade no meio da selva.

Seguindo o meu instinto, visito o ex-líbris da capital, o Teatro Amazonas, um dos poucos sinais remanescentes do período áureo da exploração da borracha e testemunho vivo de ocupação europeia.


A visita começa as 15.30 e durante uma hora pude contemplar uma das muitas construções projectadas pelos portugueses nos finais do século XIX, obra-prima da Belle Époque, altura em que se faziam fortunas com a extracção da borracha.
È caracterizada no seu exterior pela cúpula revestida com 36.000 azulejos coloridos, principalmente com as cores da bandeira do Brasil.
O seu magnífico interior está muito bem preservado, limpo e cuidado, com fabulosos tectos pintados à mão e soalhos de madeira multi-colorida, matéria-prima oriunda principalmente da Europa.


No fim do tour visito uma tasquinha interessante – a tasquinha da Gisela, propriedade do Sr. Joaquim, onde vende o famoso caldo designado por Tacacá.

É um tipo de sopa preparada com o tucupi (sumo de uma espécie de mandioca previamente fervido com alho e chicória), camarões secos, goma (mingau feito com uma massa fina e branca, resultado da lavagem da mandioca ralada) e jambú (considerado como afrodisíaco). O tacacá é servido em cuias (metades de cocos), acompanhado ou não com molho de pimenta-de-cheiro, e é encontrado geralmente em todo o Amazonas, em barracas da famosas “tacacazeiras”. É um prato originário dos índios bastante substancial por sinal.

Fiquei rendido pela explicação da receita e pelas dicas do Sr. Joaquim. Despeço-me dele com a sensação de um dia bem passado com a vontade de regressar, talvez um dia… !
Já com o bilhete na mão e com a cama de rede comprada por 15 reais só me resta que a travessia até Porto Velho corra pelo melhor e de preferência rápido – entre 3,5 a 4 dias…. rapidinho, não acham?

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Passagem pela Reserva Indígena.

Saio de Rorianopolis em direcção de Manaus - distância: 470 km. Encho novamente o depósito de combustível, mas desta vez com gasolina “contaminada”. A baixa “octanagem” desta gasolina transformou esta travessia num inferno. Os injectores acostumados a gasolina da Venezuela, com 91 octanas, sofrem com a mudança da gasolina do Brasil, com apenas 70, misturada com álcool e a um preço impressionante… 2,72 reais o litro, um verdadeiro assalto!
Com a moto aos soluços, com uma viagem complicada pela frente e com o mito instalado a volta da Reserva, restou-me rezar e pedir que conseguisse chegar a Manaus são e salvo… a moto logo se vê!
A progressão da moto é medíocre mas procurei não forçá-la nem sobreaquecê-la. Ao apertar a embraiagem nas reduções de velocidade, a mota desligava constantemente… que terror!
Quarenta km antes da Reserva encontro a linha do Equador… o GPS não falha e as imagens assim o confirmam. O calor é abrasador!




Arranco do ponto zero para sul e após 30 minutos de viagem avisto ao longe a entrada da Reserva Indígena da tribo dos Waimiri Atroari.


É um percurso de 124 km com uma estrada horrível em plena selva tropical com animais selvagens, vegetação verde, densa e com paisagens surreais.

Esta reserva alberga uma população com cerca de 200 indígenas, onde mantêm as suas tradições, apesar de se encontrarem “occidentalizados” de mais para o meu gosto. Não se pode parar, filmar nem fotografar. É muito restrito e quem não cumprir as leis, poderá sofrer represálias.



Arrisque e parei várias vezes, fotografei e filmei… nada me aconteceu. Vi alguns indígenas mas não tive oportunidade de fotografa-los, foi pena!


A estrada é um caos, toda esburacada, por vezes de alcatrão e com buracos abissais, todos tapados com água barrenta das chuvas torrenciais.

A humidade é alta e o calor abafa. Bebi mais de 3 litros de água em menos de 3 horas.
Passada a reserva decido continuar directo até o meu destino sem parar, tenho de chegar cedo para resolver o problema da moto.
Ao chegar fiquei pasmado, tinha uma ideia errada de Manaus… pensava que era uma cidadezinha um pouco maior que Boa Vista… Errado!
Manaus é uma metrópole com cerca de 2 milhões de pessoas, bastante industrializada e movimentada. É a capital do estado do Amazonas e o ponto de partida para a descoberta da selva. A cidade fica na confluência dos dois maiores rios do mundo – o Solimões (designação do rio Amazonas neste troço) e o rio Negro. O rio Madeira corre a jusante de Manaus e será o meu companheiro durante a travessia de 4 dias até Porto Velho.
Vendo tamanha confusão, tanta gente a circular pelas estradas e a mota sempre a desligar no pára-arranca começo a ficar realmente preocupado. Pergunto a um motociclista se existe algum concessionário da Suzuki e ele respondeu sem hesitar: ”sim meu velho, me siga que eu levo-o lá”. Palavras sagradas!
Passados uns minutos e com muita chuva encima chego ao concessionário Arena Motos, gerido pelo Rodrigo, um jovem extremamente profissional com uma equipa extraordinária. O meu primeiro contacto foi com o Samuel, que proferiu estas palavras: “não fique preocupado, você está em casa, pode deixar tudo aqui que ninguém mexe”.
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Deixei o equipamento todo a confiança, inclusive a moto... (risos)
Tomei um cafezinho, troquei de roupa e depois de tudo tratado fizeram o obséquio de me levar até o hotel., que maravilha.
No hotel, negoceio o preço da melhor maneira e por fim oferecem-me as refeições durante a estadia.
Para quem viu o dia mal parado, correu melhor do que esperava.
Estou deslumbrado com a simpatia e a humildade destas pessoas, sempre muito atenciosas e disponíveis para ajudar.

Manaus